Transcrevo
a seguir uma análise, datada de 05/08/3013, da Jornada Mundial de Juventude
feita pelo Frei Betto, e publicada no site "Brasil de Fato", onde
estão magistralmente resumidas os núcleos de suas mensagens:
"Em
pleno inverno, a presença do papa Francisco no Brasil, para participar da
Jornada Mundial da Juventude, foi uma calorosa primavera. Ele trouxe alegria,
esbanjou sorrisos, beijou crianças, apertou as mãos do povo.
Os frutos
dessa inesquecível visita podem ser resumidos em 15 pontos:
1.
Francisco quer uma Igreja “pra fora”, desenclausurada, missionária, engajada na
periferia e servidora dos pobres;
2. Na
favela de Varginha, ele delineou seu perfil de Igreja: “advogada da justiça e
defensora dos pobres diante das intoleráveis desigualdades sociais e econômicas
que clamam ao céu”;
3. Nossa
atuação pastoral deve dedicar especial atenção às crianças, aos jovens e aos
idosos. Os primeiros, por encarnarem o futuro; os segundos, por guardarem
sabedoria;
4. Há que
combater a corrupção e, ao mesmo tempo, alentar a esperança em “um mundo mais
justo e solidário”;
5. A
solidariedade – “quase um palavrão”, disse o papa – deve ser o eixo de nossa
pastoral, disposta a “colocar mais água no feijão”;
6. Devemos
combater a “cultura do descartável”, que ignora o valor das pessoas e estimula
o consumismo e o hedonismo;
7.
Precisamos saber “perder tempo” com os pobres, saber escutá-los;
8. A
Igreja deve espelhar a simplicidade de Jesus, como Francisco de Assis e o papa
Francisco, que dispensou a capa de arminho, os sapatos vermelhos, o anel e a
cruz de ouro, os títulos de Sumo Pontífice e Sua Santidade, por preferir ser
chamado apenas de papa, bispo de Roma, servo dos servos de Deus;
9. A
segurança dos cristãos deve estar na confiança em Deus, e não no excessivo
conforto que nos afastam dos pobres e do povo;
10. É
preciso recuperar a confiança dos jovens nas instituições políticas, alentá-los
na esperança; e “reabilitar a política, uma das formas mais altas de caridade”;
11. A
política deve “evitar o elitismo e erradicar a pobreza”, condenando os
opressores, como fez o profeta Amós ao denunciar que “vendem o justo por
dinheiro e o pobre por um par de sandálias”;
12.
Precisamos promover a “cultura do encontro”, favorecendo o diálogo sem
preconceitos, combatendo os fundamentalismos e as segregações;
13. A
sociedade futura, “mais justa, não é um sonho fantasioso”, mas algo que podemos
alcançar.
14. Os jovens
devem ser os “protagonistas da história”, construtores do futuro, de um mundo
melhor.
15. As
manifestações dos jovens nas ruas merecem o nosso apoio, pois eles “saíram nas
ruas do mundo para expressar o desejo de uma civilização mais justa e fraterna.”
Francisco
iniciou a reforma da Igreja pelo papado, como quem está convencido de que, para
mudar o mundo, é preciso primeiro mudar a si mesmo. Agora, há algo de novo na
barca de Pedro, cujas velas são tocadas pelo sopro do Espírito Santo."
Sem desmerecer a importância dos pontos acima
aludidos, desejo observar outros, tão importantes quanto, direcionados à
formação cristã do povo. Segundo nosso querido Papa,
1 -
"O resultado do trabalho pastoral não assenta na riqueza dos recursos, mas
na criatividade do amor. Servem certamente a tenacidade, a fadiga, o trabalho,
o planejamento, a organização, mas, antes de tudo, você deve saber que a força
da Igreja não reside nela própria, mas se esconde nas águas profundas de Deus,
nas quais ela é chamada a lançar as redes.
2 - Às
vezes, perdemos aqueles que não nos entendem, porque desaprendemos a
simplicidade, inclusive importando de fora uma racionalidade alheia ao nosso
povo. Sem a gramática da simplicidade, a Igreja se priva das condições que
tornam possível «pescar» Deus nas águas profundas do seu Mistério.
3 - Hoje estamos em um novo momento. Segundo a feliz expressão do Documento de Aparecida, não
é uma época de mudança, mas uma mudança de época. Sendo assim, hoje
é cada vez mais urgente nos perguntarmos: O que Deus pede a nós? A esta
pergunta, queria tentar oferecer qualquer linha de resposta.
O ícone de Emaús como chave de
leitura do presente e do futuro:
- O mistério difícil das pessoas
que abandonam a Igreja; de pessoas que, após deixar-se iludir por outras
propostas, consideram que a Igreja - a sua Jerusalém - nada mais possa lhes
oferecer de significativo e importante.
O fato é que hoje há muitos que são como os dois discípulos de Emaús; e
não apenas aqueles que buscam respostas nos novos e difusos grupos religiosos,
mas também aqueles que parecem já viver sem Deus tanto em teoria como na
prática.
Perante esta situação, o que fazer?
Serve uma
Igreja que, na sua noite, não tenha medo de sair. Serve uma Igreja capaz de
interceptar o caminho deles. Serve uma Igreja capaz de inserir-se na sua
conversa. Serve uma Igreja que saiba dialogar com aqueles discípulos, que,
fugindo de Jerusalém, vagam sem meta, sozinhos, com o seu próprio desencanto,
com a desilusão de um cristianismo considerado hoje um terreno estéril,
infecundo, incapaz de gerar sentido.
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Hoje,
serve uma Igreja capaz de fazer companhia, de ir para além da simples escuta;
uma Igreja, que acompanha o caminho pondo-se em viagem com as pessoas; uma
Igreja capaz de decifrar a noite contida na fuga de tantos irmãos e irmãs de
Jerusalém; uma Igreja que se dê conta de como as razões, pelas quais há quem se
afaste, contém já em si mesmas também as razões para um possível retorno, mas é
necessário saber a totalidade com coragem.
Eu
gostaria que hoje nos perguntássemos todos: Somos ainda uma Igreja capaz de
aquecer o coração? Uma Igreja capaz de reconduzir a Jerusalém? Capaz de
acompanhar de novo a casa? Em Jerusalém, residem as nossas fontes: Escritura,
Catequese, Sacramentos, Comunidade, amizade do Senhor, Maria e os Apóstolos...
Somos ainda capazes de contar de tal modo com essas fontes, que despertem o encanto
pela sua beleza?
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A Igreja sabe
ainda ser lenta: no tempo para ouvir, na paciência para costurar novamente e
reconstruir? Ou a própria Igreja já se deixa
arrastar pelo frenesi da eficiência? Recuperemos, queridos Irmãos, a
calma de saber sintonizar o passo com as possibilidades dos peregrinos, com os
seus ritmos de caminhada, recuperemos a capacidade de estar-lhes sempre perto
para permitir a eles abrirem uma brecha no desencanto que existe nos corações,
para que possam entrar. Eles querem esquecer Jerusalém onde residem as suas fontes,
mas assim acabarão por sentir sede. Serve uma Igreja ainda capaz de acompanhar
o regresso a Jerusalém! Uma Igreja, que seja capaz de fazer descobrir as coisas
gloriosas e estupendas que se dizem de Jerusalém, de fazer entender que ela é
minha Mãe, nossa Mãe, e não somos órfãos! Nela nascemos. Onde está a nossa
Jerusalém em que nascemos? No Batismo, no primeiro encontro de amor, na
chamada, na vocação!
Serve uma Igreja capaz ainda de
devolver a cidadania a muitos de seus filhos que caminham como em um êxodo.
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Educação, saúde, paz social são as urgências no Brasil. A Igreja tem uma palavra a
dizer sobre estes temas, porque, para responder adequadamente a esses desafios,
não são suficientes soluções meramente técnicas, mas
é preciso ter uma visão subjacente do homem, da sua liberdade, do seu valor,
da sua abertura ao transcendente.
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A Igreja não é jamais uniformidade, mas diversidades que se harmonizam na
unidade, e isso
é válido em toda a realidade eclesial.
Que a
Virgem Imaculada Aparecida seja a estrela que ilumina o compromisso e o caminho
de vocês levarem Cristo, como Ela fez, a cada homem e cada mulher de seu imenso
país. Será Ele, como fez com os dois discípulos extraviados e desiludidos de
Emaús, a aquecer o coração e a dar nova e segura esperança."